Antes de praticarmos, precisamos nos observar e determinar onde estão nossas habilidades. Devemos discernir qual desses dois os principais tipos de personalidade nos definem melhor: sensual ou analítico; isto é, as nossas paixões residem principalmente em prazeres mundanos ou intelectuais?
Se somos do tipo que é feliz com prazeres mundanos, beleza, conforto, podemos nos beneficiar mais da observação do corpo. Isso porque quando observamos o corpo percebemos facilmente que ele não é confortável, que é da natureza da insatisfação, podemos desapegar deste corpo. Já aqueles que pensam demais, que vivem entretidos em suas cabeças, devem começar por observar a mente e o turbilhão de pensamentos, percebendo que também se distinguem da mente.
Resumindo: se formos principalmente motivados pelos sentidos, devemos observar corpo primeiro. Se formos analíticos, devemos observar a mente primeiro.
As outras duas áreas que devem ser observadas de acordo com os ensinamentos de Buda sobre os quatro fundamentos da atenção, o Satipatathana Sutta, são sentimentos (Vedana-Nupassana) e a verdadeira natureza dos fenômenos (Dhamma-Nupassana). Não devemos meditar nessas áreas até que nossas mentes estejam um pouco mais avançadas, um pouco mais maduras para sabedoria. Observe a mente e o corpo primeiro, pois eles são fundamentais.
Atenção no corpo
Ao observamos o corpo, não devemos ficar imersos nele. A mente deve estar independente e assistir à distância como se estivéssemos observando outra pessoa.
Vemos este corpo em pé, andando, sentado e deitado. A mente é observadora. Quando praticarmos dessa maneira, percebemos diretamente que o corpo não somos nós. Não há necessidade de pensar nisso; o corpo será claramente e diretamente visto como não-nós ou nosso (anatta). O corpo se levanta, caminha, senta e deita e a mente observa.
É assim que se observa o corpo. Um dia a verdade mostrará que o corpo é apenas carne e ossos, água, calor e movimento. O corpo está sob constante opressão pela insatisfação (dukkha), sempre em algum tipo de desconforto.
Então a mente ordena que o corpo se mova ou aja para tentar aliviar o desconforto. Quando praticarmos corretamente, descobriremos as verdadeiras características do corpo por nós mesmos.
A prática básica de meditação sobre o corpo é a atenção na respiração, como explicada nesse post. Contudo, é recomendável que você mude seu foco depois de dominar sua respiração, sentindo todo o seu corpo holisticamente. O que você ganha desta prática também é a atenção plena, mas é uma atenção plena que é livre para observar outras ocorrências ou emoções.
Sinta todo o seu corpo
- Sinta todo o seu corpo através de intensa observação. Observe seu corpo de cima para baixo, da cabeça aos dedos dos pés.
- Observe cada parte do corpo: em detalhes, a frente e as costas, o topo, a base, as laterais. Por exemplo, se você está observando seu braço, observe-o de cima para baixo, de frente, de trás, e dos lados.
- Em seguida, passe para outra parte do corpo e faça o mesmo.
- Quando terminar de observar todas as partes do corpo, inverta e recomece de baixo pra cima. Repita essas observações até conseguir dominar essa prática.
O domínio dessa habilidade é altamente benéfico para você, pois é capaz de mover sua consciência para diferentes partes do corpo fortalece sua atenção plena e compreensão clara para que possam ver através seu corpo como o raio-x, seja de frente para trás, de cima para o fundo ou vice-versa. Você pode usar esta técnica para extinguir seu sofrimento durante uma doença.
A mente, que não se limita a um lugar, mas pode viajar por todas as áreas do corpo, pode desenvolver a atenção plena e a compreensão clara rápida e eficazmente. Este é um método popular na senda dos mestres que pode ajudar a mente a manter a concentração o dia todo. A atenção plena e a compreensão clara tornam-se altamente avançadas.
Observação holística
- Use a atenção plena para observar seu corpo sem se concentrar em qualquer estado particular.
- Observe o estado em que as partes do corpo estão: sua posição (cabeça, pescoço, costas e braços) movimentos e sensações.
- Veja se você experimenta novas sensações. Observe as sensações. Suas pernas podem sentir frio, então observe isso. Suas costas sentem calor; apenas observe. Quando você sente uma nova sensação, em qualquer lugar do seu corpo, mova sua consciência para lá e sua atenção plena e clara se tornará altamente desenvolvida.
Essa técnica permite que você use tudo o que acontece com o seu corpo como ferramentas para desenvolver a atenção plena e compreensão, seja sua respiração, funções corporais, sentimentos, pensamento, etc.
Observe o que aparecer a qualquer momento na mente e aprenda a partir dela. Este método é uma maneira de praticar a atenção plena. Concentração e sabedoria podem ser alcançadas e você se torna ciente de seus campos sensoriais internos: olhos, ouvidos, nariz, língua, corpo e mente.
A meditação sobre o corpo usando apenas esses dois métodos leva a benefícios. Não há impacto negativo dessa prática. Uma vez que a prática for dominada, você não precisará mais se concentrar em sua respiração.
Atenção na mente
Observar a mente é mais fácil do que observar o corpo. É difícil observar o corpo corretamente se a mente não está firmemente enraizada consciência, isto é, se nossa mente tende a escorregar para o objeto de observação.
Quando observamos a mente, veremos que há duas coisas que surgem em cada momento: um fenômeno mental e consciência. Isto é porque a consciência de alguém não surge a menos que haja um fenômeno mental – eles aparecem em uníssono.
Não podemos observar a mente sem fenômenos mentais (cetasika) porque a mente não tem corpo ou forma própria. Então, primeiro devemos observar cada fenômeno mental, seja ele classificado como sentimento ou sensações (vedãna), memória (sañna) ou pensamento ativo ou formações mentais (sankhara).
Todos esses fenômenos surgem e decaem em conjunto com a consciência. Por exemplo, às vezes temos uma mente virtuosa e às vezes não. Nossa impressão é que a mente que nos pertence agora é virtuosa, ou é ambiciosa, ou está perdida em pensamentos ou percepções sensoriais. É assim que nós observamos em primeiro lugar. Mas quando surgir a mente madura com sabedoria, ela verá claramente que consciência é uma coisa e ambição é outra. Consciência é uma coisa e não gostar é outra. Consciência é uma coisa e pensamento é outro. Eles se mostrarão como processos separados e distintos.
Os meditadores devem constantemente aplicar plena consciência do presente simplesmente reconhecendo a existência e natureza desses fenômenos mentais. Não há intervenção consciente envolvida para suprimir um pensamento ou incentivar outro. É um processo simples e descomplicado de reconhecer as realidades como são, um puro ato psicológico de desapego compreensão e aceitação.
Ao praticar continuamente de acordo com esse método, não apenas passa a entender-se melhor, mas eventualmente penetrará profundamente nos confins mais remotos da própria consciência. Esse tipo de prática contribui substancialmente para a paz e harmonia, tanto do indivíduo como da sociedade.
Mais tarde seremos capazes de observar diretamente a sua verdadeira natureza (Dhamma-Nupassana). Mas primeiro, continue assistindo e conhecendo os fenômenos que surgem na mente. Se já praticamos uma certa técnica de meditação que envolve vigiar o corpo e/ou a mente, é recomendável que fiquemos com ela.
Não há necessidade de parar ou mudar o que fazemos. Quando entendemos os princípios corretamente, devemos integrá-los em nossa prática atual. Nossa postura e técnica não são nem um pouco relevantes. Podemos apenas continuar praticando qualquer que seja o estilo que aprendemos no passado, embora devamos trazer uma compreensão para isso. Se os princípios fundamentais por trás de nossa prática são inexistentes ou mal interpretados, não importa quão graciosamente estejamos sentados; não praticaremos Vipassana e o que fazemos não levará ao Insight.
A origem do ensinamento
Textos traduzidos por mim, retirados do livro Walk to be the knower de Phra Anek Thanissarapoti. Recebi este livro como presente durante um retiro de vipassana num monastério tailandês. Me pediram para espalhar a palavra e divulgar o ensinamento. É o que busco realizar ao disponibilizar esse conteúdo aqui.
“Andar para ser o conhecedor” é a maneira de praticar meditação com a concentração certa para despertar nossa mente para fora do mundo do pensamentos e das fabricações.
O objetivo deste livro é apenas orientar os estrangeiros a compreender melhor a prática da Meditação Vipassana e o Budismo.