Na cosmologia chinesa, yin e yang são dois princípios opostos e complementares que regulam o funcionamento do cosmos. Sua repetida alternância fornece a energia necessária para o cosmos se sustentar e sua junção e separação contínuas estão na origem da ascensão e queda de todos os fenômenos.
As noções de yin e yang afetaram profundamente a cultura chinesa como um todo. Representações dessas noções são encontradas na religião, na arte e em vários outros contextos; desempenham um papel central nas ciências e técnicas tradicionais, como a medicina, adivinhação e alquimia. Além disso, a busca pelo equilíbrio e harmonia entre o yin e o yang continua a ter uma influência generalizada na vida cotidiana do povo chinês.
Um conceito taoísta
O Tao é a realidade última e indefinível como tal. Sua qualidade intrinsicamente dinâmica constitui, na visão chinesa, a essência do universo. O Tao é o processo cósmico no qual estão envolvidas todas as coisas. É o princípio do Qi manifesto.
A característica principal do Tao é a natureza cíclica de seu movimento e sua mudança incessantes. “O retorno é o movimento do Tao”, afirma Lao-Tsé, e “afastar-se significa retornar”. Todos os desenvolvimentos ocorridos na natureza apresentam padrões cíclicos de ida e vinda, de expansão e contração.
Essa ideia deriva, sem dúvida, dos movimentos do Sol e da Lua e da mudança das estações, mas seu princípio é muito mais abrangente. Os taoístas observam que sempre que uma situação se desenvolve até atingir o seu ponto extremo, é compelida a voltar e a se tornar o seu oposto. Essa percepção oferece coragem e perseverança nos tempos de dificuldade enquanto pede por uma atitude mais cautelosa e modesta em tempos de sucesso, propondo o que chamamos de doutrina do meio-termo. “O sábio”, afirma Lao-Tsé, “evita o excesso, a extravagância e a indulgência”.
A polaridade Yin Yang 陰陽
A ideia de padrões cíclicos no movimento do Tao recebeu uma estrutura precisa com a introdução dos opostos polares yin e yang. São eles os dois polos que estabelecem os limites para os ciclos de mudança:
O yang, tendo alcançado seu apogeu, retrocede em favor do yin; o yin, tendo alcançado seu apogeu, retrocede em favor do yang.
Todas as manifestações do Tao são geradas pela inter-relação dinâmica dessas duas forças polares. Essa ideia é bastante antiga e muitas gerações aperfeiçoaram o simbolismo do par arquetípico yin e yang até que ele veio a se tornar o conceito fundamental do pensamento chinês.
O significado original das palavras yin e yang correspondia aos lados ensombreado e ensolarado de uma montanha, o que nos dá uma boa ideia acerca da relatividade dos dois conceitos:
Aquilo que ora nos apresenta escuridão e ora nos mostra a luz é o Tao.
De um modo geral, tudo o que é animado, em movimento, exterior, ascendente, quente, luminoso, funcional, cujas capacidades se desenvolvem, tudo o que corresponde a uma ação é yang. Tudo o que está em repouso, receptivo, tranqüilo, interior, descendente, frio, sombrio, material, cujas funções decrescem, tudo o que corresponde a uma substância é yin.
Podemos adicionar mais algumas qualidades à lista de correspondências do Yin Yang:
YANG | YIN |
Imaterial Produz energia Gera Não substancial Energia Expansão Ascendência Acima Fogo Redondo Atividade Calor Dia | Material Produz forma Cresce Substancial Matéria Contração Descendência Abaixo Água Quadrado Repouso Frio Noite |
O fato de pertencer ao yin ou ao yang não é absoluto, mas relativo, pois de um lado o yin e o yang podem sob certas condições transformar-se um no outro, do outro lado todos os fenômenos podem se fragmentar ao infinito em subpartes yin e yang. Por exemplo, o dia é yang, a noite é yin, mas a manhã é yang dentro do yang, a tarde é yin dentro do yang, o antes da meia-noite é yin dentro do yin, e após da meia noite é yang dentro do yin. Assim, no universo, qualquer fenômeno manifestado pode ser reconduzido às duas categorias yin e yang, podendo ainda cada um se separar em yin ou yang, e isso até o infinito.
O caráter dinâmico do yin e do yang é representado pelo antigo símbolo do Taijitu, ou “Diagrama do Supremo Fundamental”.
Esse diagrama apresenta uma disposição simétrica do yin sombrio e do yang claro; a simetria, contudo, não é estática. É uma simetria rotacional que sugere, de forma eloquente, um contínuo movimento cíclico. Os dois pontos do diagrama simbolizam a ideia de que toda vez que cada uma das forças atinge o seu ponto extremo, manifesta dentro de si a semente do seu oposto.
Combinações de Yin e Yang
A interação entre yin e yang, o par primordial de opostos, é o princípio que guia todos os movimentos do Tao. Os chineses, contudo, não pararam por aí. Eles estudaram as diversas combinações de yin e yang até atingir a forma de um complexo sistema de arquétipos. Esse sistema é elaborado no I Ching, ou Livro das Mutações.
O Livro das Mutações é o primeiro entre os cinco clássicos confucionistas e deve ser considerado como um trabalho que se encontra no próprio cerne da cultura e do pensamento chineses. A autoridade e consideração que tem desfrutado na China ao longo de milhares de anos só podem ser comparadas às gozadas pelos Vedas hindus.
O conhecido sinólogo Richard Wilhelm inicia a introdução à sua tradução do I Ching com as seguintes palavras:
O Livro das Mutações – I Ching em chinês – é, sem sombra de dúvida, um dos livros mais importantes da literatura mundial. Sua origem perde-se na antiguidade mítica, tendo ocupado a atenção dos maiores estudiosos chineses daquele período até os nossos dias. Praticamente tudo de mais significativo e relevante ocorrido nestes três milênios de história cultural chinesa retirou sua inspiração deste livro ou exerceu influência na interpretação de seu texto. Dessa forma, pode-se afirmar com segurança que a sabedoria, amadurecida em milhares de anos, tem participado da elaboração do I Ching.
Richard wilhelm
O I Ching é, pois, um trabalho que cresceu organicamente no curso de milhares de anos, consistindo em inúmeras camadas provenientes dos períodos mais significativos do pensamento chinês. O ponto de partida do livro é um conjunto de 64 figuras, ou “hexagramas”, que se baseiam no simbolismo yin e yang e que são usadas como oráculos. Cada hexagrama consiste em 6 linhas que podem ou ser quebradas (yin) ou cheias (yang); esses 64 hexagramas compreendem todas as combinações possíveis dessas linhas. São arquétipos que representam os padrões do Tao na natureza e nas situações humanas.
Cada um recebeu um título e foi suplementado por um pequeno texto (denominado Julgamento) para indicar o rumo da ação adequado ao padrão em questão. A assim chamada Imagem é, na verdade, um outro texto breve, acrescentado posteriormente, que elabora o significado do hexagrama em umas poucas (e, não raro, extremamente poéticas) linhas. Um terceiro texto interpreta cada uma das seis linhas do hexagrama numa linguagem carregada de imagens míticas quase sempre de entendimento difícil.
Essas três categorias de textos formam as partes básicas do livro utilizadas para a adivinhação. Tradicionalmente um ritual elaborado envolvendo cinquenta varetas é utilizado para determinar o hexagrama correspondente à situação pessoal do indagante. Hoje é mais comum o uso de três moedas para sortear a sequência de linhas yin e yang.
Varetas e moedas de I Ching
O objetivo da consulta ao I Ching não é simplesmente conhecer o futuro, mas antes de tudo, compreender a situação atual disposta no padrão do hexagrama de modo que se possa tomar a atitude mais apropriada. Essa finalidade torna o I Ching um livro de sabedoria.
Com tal propósito, o livro inspirou as maiores mentes chinesas nas diversas épocas; entre elas, Lao-Tsé que de sua fonte extraiu alguns de seus aforismos mais profundos. Confúcio estudou-o intensamente e a maior parte dos comentários sobre o texto, que compõe as camadas finais, originam-se da escola confucionista. Esses comentários, as chamadas Dez Asas, combinam a interpretação estrutural dos hexagramas com explicações filosóficas.
No centro dos comentários de Confúcio, como no centro de todo o I Ching, encontra-se a ênfase no aspecto dinâmico de todos os fenômenos. A transformação incessante de todas as coisas e situações é a mensagem essencial do Livro das Mutações e da vivência taoísta em geral.
O Livro das Mutações é uma obra
Da qual o homem não deve se manter distante.
Seu Tao está em perpétua mutação –
Modificação, movimento sem descanso
Fluindo através de seis posições vazias;
Subindo e descendo sem cessar.
O firme e o maleável mudam.
Não se pode contê-los numa regra;
Aqui só a mudança atua.
REFERÊNCIAS DE LIVROS E ARTIGOS
Fundamentos da Medicina Chinesa – Giovanni Maciocia
O Tao da Física – Fritjof Capra
O Diagnóstico na Medicina Chinesa – B. Auteroche
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